Escritos de Ada
Escritos de Ada
terça-feira, 18 de maio de 2021
quarta-feira, 5 de maio de 2021
segunda-feira, 26 de abril de 2021
Desvanecer
Nesses dias também há coisas que não são das melhores:
os passos trôpegos
a vergonha de não controlar os esfíncteres
os gritos chorosos ao chamar pela mãe enquanto olha a sobrinha.
E há os dias piores:
não há mão estendida
não há riso
há apenas o olhar vago de quem parece estar em outro mundo.
Nesses dias, meu consolo é imaginar que talvez
ele, o outro mundo, exista na cabeça desse bebê
de 93 anos de idade
um mundo onde ele não tem demência
onde ele corre com a mãe
ri do Professor Raimundo
não suja fraldas
consegue chupar doces cajus
e pode dizer
ao filho falecido
à filha ainda viva
às netas ansiosas
às cuidadoras cansadas
e à esposa resignada:
"amo vocês".
quinta-feira, 22 de abril de 2021
Meu primeiro livro
segunda-feira, 19 de abril de 2021
Reflexão diante do espelho
quinta-feira, 15 de abril de 2021
Os poemas
segunda-feira, 12 de abril de 2021
Etéreo
embora eu ainda não olhe teus olhos
terça-feira, 6 de abril de 2021
Meio jacarezinha (ou mais um post do Insta que vem morar aqui)
Acabo de concluir que minha foto mais fora do padrão Instagram é a mais curtida do meu perfil nessa rede. Isso é um bom sinal, pois o registro em questão é da minha pessoa descabelada e chorando, após tomar a primeira dose da Coronavac junto a outros autistas e também a portadores da Síndrome de Down. Recebi tantas felicitações que parecia ser meu aniversário. Pessoas choraram, me mandaram mensagem, trocentas piadas sobre virar jacaré foram feitas, o que resultou em fotos e humor de qualidade até razoável com as fotos de Cícero Tibúrcio, meu banco de madeira em formato de calango. Pois é, um bocado de gente se importa com a felicidade alheia e compartilha dela. Que bom. Que necessário.
Pois é, na semana passada eu peguei meus laudos e meu cartão de vacinacão, fui à sede da OAB/RN, esperei um tantinho, me agitei tanto que ninguém diria o infame "mas ela nem parece autista" e, após a vacina, chorei pensando em tanta coisa... Nas pessoas neurodiversas que têm seu direito ao diagnóstico negado, no trabalho incansável dos cientistas, em toda a população que ainda aguarda a vacina e segue confinada, com medo, arriscando a vida em seus trabalhos por falta de um auxílio decente e passando fome... Como não chorar?
Eu só queria que todos pudessem sentir, o mais rapidamente possível, essa mesma pequena fagulha de alívio e esperança que senti na terça-feira passada. Pessoas, valorizem o SUS. Valorizem a ciência. Se precisam de profissionais da rede privada para acompanhá-las, sejam gratas a elas/eles (Hélder, Walter, obrigada por tornarem minha vida melhor e me ajudarem a me perdoar, me aceitar, me cuidar), mas não se esqueçam dos tantos e tão incansáveis servidores públicos, entre eles os da saúde, que estão carregando este piano tão pesado.
E, por favor, não nos acomodemos. Sabemos quem são nossos inimigos e não podemos entregar tudo a eles, achando que são mais fortes do que nós.
Por fim, sempre e com força: viva o SUS, viva o serviço público, viva a ciência!!!
segunda-feira, 5 de abril de 2021
A chave de Hannah (e minha também)
"Receber o diagnóstico foi receber a chave da cidade que eu sou", diz Hannah Gadsby, sobre descobrir-se autista, no stand-up "Douglas", escrito e performado por ela e lançado na Netflix em maio de 2020, quinto mês da pandemia de covid-19, que resultou num isolamento que bagunçou o pouco que ainda me restava de organização rotineira e mental (não que estejam separadas, mas enfim...).
[Sim, é isso mesmo, vou tomar a liberdade de voltar o olhar para mim, a partir do olhar de outra autista, em meio a uma tragédia de proporções catastróficas. Licença, pois, para publicar o que escrevi um ano atrás e não tive coragem de compartilhar por medo de ser julgada. Aliás, foi interessante o rascunho deste post ter me aparecido uma semana após eu ser contemplada com a primeira dose da Coronavac junto a outros autistas e a portadores da Síndrome de Down... Enfim, os acasos.]
Pois bem, voltemos a Hannah. Ela enunciou a metáfora mais bela e potente que eu já ouvi sobre a sensação pós-diagnóstico. Sem saber, Gadsby me deu a chave para algo muito difícil de acessar: confiança. Mais do que isso, autoconfiança.
Se cada pessoa autista tem uma distinta combinação de fatores, cada uma tem um modo peculiar de pensar e de expressar seu pensamento, e essas duas coisas podem ser particularmente belas. Então, posso ser boa na minha forma de fazer as coisas. Provavelmente, tenho minha maneira de descobrir interesses, de selecionar recortes, de buscar informações, de estudar temas e de chegar a conclusões sobre eles e expressá-las. Para isso ser bom, não precisa ser como meus modelos são. Pode ser bom e bonito do meu jeito.
Hannah me ajudou a entender que uma das minhas amarras é tentar me incluir nos grupos - tentar ser aceita com base do que os outros aceitam - e não respeitar a minha maneira de ser, que, presumo, não machuca os demais, enquanto me forçar em contêineres alheios me deixa em pedacinhos. Talvez meu desconforto de hoje seja o que sempre existiu, o de querer me sentir "encaixada" nas estruturas e, para isso, tentar mais ser como os outros do que ser eu mesma e falar do que gosto, da forma como sei fazer.
É fato que o autismo não é a única coisa a me definir, mas, indiscutivelmente, é grande parcela do que me constitui. Compreender (e aceitar) isso não é me limitar ao rótulo, e sim me expandir explorando todas as possibilidades que me são dadas por ser quem sou.
Se eu encontrasse Hannah agora, diria que "Douglas" me fez repensar o que sou e o que posso ser, e como meu tempo, meus interesses, minha jornada não precisam ser os dos outros. E diria que talvez eu até já tivesse a chave, mas a não a visse, embora estivesse bem nas minhas mãos... Agora, eu a toco sei o que ela abre, e o que vejo é tanto que não posso definir sequer como cidade ou como outra coisa qualquer... Mas sei que compreendo e acolho, e isso, quanto a mim, me basta.