Escritos de Ada

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Texto velho sobre o novo, porque o novo vem de novo (sempre)

Publiquei o texto a seguir no Novo Jornal, em novembro de 2009, período em que eu tentava lidar com minhas borboletas no estômago - elas sempre vêm quando me meto a andar em terrenos desconhecidos. Depois, a crônica veio parar aqui no blog em março do ano passado, outra época de incertezas - umas se dissipando, outra se avizinhando, batendo feio no meu estômago, no meu sono, no meu equilíbrio.
Agora, novamente. Um novo que vem se desenrolando desde semestre passado, um novo-novo se aproximando e um novo que nem começou ainda, mas já me traz as borboletas de novo. E, mais uma vez, esse texto me vem diante dos olhos. Não, eu não o procurava. Estava só vagando a esmo no meu próprio blog, sem saber o que fazer com a falta de palavras, a falta de sono, a falta de paciência, a falta de certezas... E meu próprio texto me parece providencial, agora. Ei-lo.


“Não há um porquê”, responde Phillipe Petit, estrela de O Equilibrista(direção de James Marsh e Oscar 2009 de melhor documentário), quando alguém pergunta o que o leva a atravessar grandes distâncias sobre uma corda bamba. 

O francês Phillipe Petit ganhava a vida nas ruas, fazendo truques de ilusionismo e de equilibrismo. Ficou famoso em 1971, quando, aos 22 anos de idade, caminhou sobre um cabo esticado entre as duas torres da catedral de Notre Dame, em Paris. Três anos depois, no dia 7 de agosto, burlou a segurança do extinto World Trade Center, em Nova York, para atravessar oito vezes seguidas o espaço entre as torres gêmeas. A performance durou quase uma hora e foi assistida por cerca de cem mil pessoas. O artista foi preso após o ato ilegal, e condenado a uma pena simbólica: fazer um espetáculo infantil, gratuito, em um jardim.

Andar sobre o vão entre as inacabadas torres gêmeas exigiu planejamento, treino do corpo e da mente e equilíbrio entre ambos. Depois, deslizar sobre o cabo. E mais. Phillipe fez graça para o público, sentou sobre a corda, pulou, conversou com as aves. Phillipe era um bamba da corda. Mas ainda um mortal – maluco – sobre um cabo de aço a mais de 400 metros de altura, sem segurança ou rede de proteção. A velha arte do equilibrismo, num trajeto nunca antes percorrido.

Repiso o clichê de propósito. Por quê? Não existe um porquê. Existe vontade.

Mas andar em novas trilhas exige, além da vontade, conhecer o terreno – ou a corda – onde se pisa. Planejar, calcular e seguir. Equilibristas experientes não temem o avanço em meio à lâmina do vento. Dão um passo para trás, oscilam para os lados, mas jamais param no meio da corda. O medo de cair impede o progresso.

No entanto, há que se ter cautela; correr expõe ao risco de tropeçar nos próprios pés, e o público sob a corda pode não amortecer a queda. Sempre há quem se divirta nessas ocasiões. Por isso, é importante manter o foco: levantar a cabeça e olhar para a frente evita a vertigem.

Mas os outros são os outros. Eles apenas podem assistir ao êxito ou à derrocada alheia. Arriscar-se na corda bamba é, primordialmente, desafiar-se, colocar-se à prova. E, mais do que arriscar, descobrir o ponto em que a força motriz transforma-se não em explosão desastrosa, mas na leveza de um Phillipe Petit, caminhando suspenso sobre o vão entre duas torres, cheio de uma vontade que só os malucos, em sua peculiar lucidez, possuem.

Um comentário:

  1. Belo cenário! É bonito ver os que se deixam viver, os que se arriscam. Arriscar-se é atributo necessário para viver o novo. É verdade sim - gostei da lembrança - que o público sob a corda pode não amortecer a queda, mas faz bem acreditar, mesmo sem contar.

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